O Mundo que Tenho em Mim
- Jéssica Marques
- 30 de abr. de 2020
- 6 min de leitura
O mundo que tenho em mim, desde quando era uma criança introspectiva, transborda quando vejo filmes, e leio livros. Esse sentimento que carrego, ainda é um mistério para mim mesma… E as artes que crio e posto nesta, e outras redes sociais, é uma tentativa de saber qual é a minha história...Ultimamente estou sendo questionada, sobre quem eu sou e o que eu quero, em cursos de inteligência emocional e nesse isolamento social forçado. Essa nova dinâmica me leva a conviver ainda mais comigo mesma… E em uma das minhas várias respostas solitárias, me defini como:
“Uma mulher feita de amor e poesia, que é levada pela filosofia e pela literatura ao criar as imagens e textos que imagina por aí!”
Mas essa minha definição me levou ao pensamento: Por que o amor e a poesia me movem? Eu ainda não sei falar sobre isso de uma forma racional, então se você, que me lê, se identificou com essa ideia, deixa um comentário aí embaixo para que eu não me sinta ainda mais “alternativa” do que já me sinto *risos*
Nesse exercício de contar quem eu sou, eu poderia fazer das minhas características físicas um conto de fadas daqueles que você se sente a Beth, a feia, com meu tampão para estrabismo aos 3 anos, que vai se transformando no Cisne Negro que é admirado, mas que ainda tem um quê de outsider, forasteiro, aparentemente, sem rumo e sem saída.
E essa falta de rumo ainda se faz presente em mim, quando me descobrir uma mulher negra privilegiada, pela educação e condição de vida que meus pais lutaram muito para me proporcionar, o que faz com que eu me sinta menos negra, ou ainda, menos merecedora dessa característica, que marca uma luta profunda, de um povo plural e único, desde o início da humanidade.
Muitos já me chamaram de patricinha nerd, o que é um verdadeiro contra senso dos estereótipos sociais, e que por muito tempo eu mesma me defini como esse mosaico de atributos, já que não sabia quem era… Ou melhor ainda não sei e é por isso que esse texto é um parto de uma nova Jéssica, já que hoje também me vejo como:
“Uma velha criança que busca sabedoria através da imaginação e das relações com o mundo ao seu redor.”
Essa busca de uma sabedoria imaginativa me fez entrar no mundo das artes antes mesmo de eu saber o que era uma profissão. No meu sonho de criança sempre me vi como uma desenhista, e quando tinha na faixa dos 8 para 9 anos quando me perguntavam a famosa frase “O que você quer ser quando crescer?” Eu respondia sem o menor pudor: ESTILISTA!

Pois é, meus queridxs leitores(se é que esse texto vai ser lido por mais alguém do que eu mesma aos 40 anos de idade =P), por muitos anos me vi apaixonada pela ideia de vestir pessoas com roupas estilosas, que via em desfiles de moda ou em filmes da disney, mas com o tempo descobri que aquele espetáculo da passarela não passava disso: uma história moldada para encher os seus olhos ou de beleza ou de estranheza. E esse espetáculo só se realizava ali, na passarela, por que no final do dia a moda vai e volta numa eterna renovação de si mesma.
E dessa constatação veio a vontade de encher os olhos das pessoas, através da minha ótica, de óculos fundo de garrafa, daquela menininha que, desde de os 3 anos de idade, não se vê sem essa lente protetora. Mas como fazer isso? Pois bem, eu entrei na mostra de profissões pensando deve ser algo visual com certeza, mas seria Design? Seria Artes Visuais? Haveria outra opção artística dentro das universidades? Esses questionamentos foram respondidos quando entrei no stand das Artes Visuais da UFMG, em 2008, na época em que todas as 7 artes andavam juntas nesse curso e eu tive a certeza de que faria esse curso com habilitação em Cinema!
E assim como tantas outras certezas na vida, essa foi abalada em um piscar de olhos, quando em 2009, a UFMG criou o curso de Cinema de Animação e Artes Digitais (CAAD) e extinguiu a habilitação em Cinema das Artes Visuais. Mas antes de ter outras frustração, tentei as duas opções ao mesmo tempo. Me inscrevi para Artes Visuais na UEMG e Cinema na UFMG e na UNA. Passei na UNA e na UEMG e como essa última é pública, optei por ela… e descobri que tal graduação era voltada para a licenciatura, ou seja, ao invés de artista estava me formando para ser professora de artes… E não me entenda mal, admiro muito essa profissão afinal tudo que sou hoje devo a educação que eu tive pelos meus pais e professores, mas não me via sendo apta a carregar mais essa carga de ensinar a alguém, de formar o caráter de um indivíduo. Dito isso, entre uma aula de didática e outra de desenho, conheci o Centro da Imagem da UEMG, no qual fiz um estágio na produção de um stop motion chamado Virtuous Circle, que foi a minha alegria, juntamente com os amigos que fiz durante aquele ano de 2011.
Uma outra alegria a ser comemorada neste ano foi a premiação que esse curta teve no 10º Festival Imagem em Movimento, que a minha paixão é a animação e me deu a certeza de que eu tinha que tentar a graduação de Cinema de Animação de novo. E em 2013 consegui mais essa proeza, e nos próximos 5 anos, entre altos e baixos. me vi mais como uma ilustradora do que animadora, mas que ainda mantive o desejo de contar histórias inusitadas, sejam estáticas, ou em movimento.
Nesse processo tive a experiência incrível, de um intercâmbio acadêmico para Faro, no sul de Portugal. E durante esses 6 meses de trocas e aprendizados me vi apaixonada por uma nova forma de arte… A tipografia! Que nada mais é do que pensar na identificação da forma de uma letra para contar uma história, uma simbologia. O que para mim virou um marco pessoal de como eu sou feita de símbolos, tanto quanto toda a nossa cultura. O que apenas reforçou uma vontade antiga de pesquisar sobre a simbologia da morte e relacioná-la com os ciclos que vivemos em nossos relacionamentos. Sendo assim, passei a focar a escrita do meu TCC nessa ideia da morte simbólica dentro do amor e como ela era demonstrada em filmes como A Noiva Cadáver do Tim Burton.
E essas simbologias, muitas vezes, me fizeram pensar se as minhas lutas por um espaço nas artes não estão minimizadas por mim mesma, quando penso que: Estudar em uma faculdade federal em um curso, nada tradicional e que, querendo ou não, ainda é elitizado e nichado, seria o bastante para me reafirmar como uma artista negra?!
Mesmo para uma filha de servidores públicos, que tiveram condições de me fazer entrar nesse mundo acadêmico de uma forma mais suave e ESPERADA… E sempre me fizeram ter certeza de que essa entrada óbvia, ainda deve ser enaltecida e eu deveria sentir que é uma oportunidade única e não deveria desperdiçá-la. Na verdade, esse é um sentimento que me assombra até hoje, pois a carga emocional que é posta na minha carreira, muitas vezes vem desse sucesso que meus pais alcançaram e que eu me sinto na obrigação de conseguir também. E muitas vezes ver o meu sucesso acadêmico, ainda não me faz sentir merecedora de tal patamar na nossa sociedade, já que vi muito poucas mulheres negras nesse patamar de roteiristas renomadas dentro da indústria cinematográfica, principalmente na brasileira, que ainda é uma indústria minimizada ao lado de outras tantas como a americana e a francesa. Ou seja, me vejo duplamente invisibilizada, e a dúvida em ser uma escritora, roteirista, fotógrafa ou qualquer outro ramo da arte se faz e desfaz todos os dias.
E o meu sonho de ser roteirista nesse mundo do cinema, só se faz presente na minha mente, a partir do auxílio de amigos que acreditam em mim e no meu talento, mais do que eu mesma muitas vezes. A minha escrita escapista, muitas vezes encontra um eco nas dores de vocês que me lêem e essa ligação é o que me conforta e me impulsiona a continuar nesse caminho tortuoso das artes da escrita visual!
Obrigada por me lerem até aqui, pois sei que esse não é um texto fácil de ser compreendido, talvez até tenha me perdido em tantos questionamentos abertos por ele, mas fica registrado aqui como uma tentativa de me perceber e perceber o mundo a minha volta...e até a próxima viagem!
PS: Prometo que a próxima imersão vai ser mais tranquila, já que essa angústia que acabou de ler já diminuiu de alguma forma através dessas linhas.
Comments